Não
há dúvidas de que o Espiritismo compreende a existência na Terra como uma etapa
da nossa vida de espíritos imortais. Como bem registrado no livro “O Céu e o
Inferno”, no capítulo II da primeira parte, os espíritas aguardam a morte do corpo
como um “despontar do sol após uma noite de tempestade”. Mas se os espíritas
possuem essa visão da existência terrena, por que muitas vezes choram quando um
ente querido desencarna?
Claro
que não há uma resposta única que possa prever o que se passa no coração de
cada um de nós quando “perde” um ente amado. Entretanto, uma resposta razoável
para o pranto seria a saudade¹, compatível com a certeza de que seus pais, avós,
irmãos ou amigos estão verdadeiramente vivos, sem o corpo físico. A sensação é
parecida com a de uma mãe que ficará um longo período sem ver o filho que foi morar
no exterior. Ela tem certeza que reencontrará esse ser tão amado. Não sabe ao
certo quanto tempo terá que esperar, mas não tem dúvida que futuramente irá abraçá-lo.
Semelhante a de alguém que se despede de um familiar que trabalha “embarcado”.
Ao ver o navio se afastando no horizonte o perde de vista... mas tem certeza de que ele está em um local seguro,
ainda que os olhos não consigam enxergar.
O
choro que muitas vezes desce dos olhos deve retratar a saudade imposta pela
distância física, devido ao apego às sensações da carne que nós, espíritos em
evolução, ainda guardamos em nosso íntimo². Por outro lado, a tranquilidade é
resultado da certeza da imortalidade da alma e do reencontro futuro, um dia, na
verdadeira vida. O conforto advém da proximidade espiritual através do
pensamento, da prece e das vibrações positivas. Além da certeza de que o ente
querido está muito bem amparado nessa nova etapa da jornada. Sobre essa
dualidade entre a saudade natural e a dor incessante, os espíritos deixam claro
que o equilíbrio é essencial, resultado da fé no futuro e confiança em Deus,
conforme pergunta 936 de “O Livro dos Espíritos”: 936. Como é que as dores
inconsoláveis dos que sobrevivem se refletem nos Espíritos que as causam?
O
Espírito é sensível à lembrança e às saudades dos que lhe eram caros na Terra; mas,
uma dor incessante e desarrazoada o toca penosamente, porque, nessa dor excessiva,
ele vê falta de fé no futuro e de confiança em Deus e, por conseguinte, um obstáculo
ao adiantamento dos que o choram e talvez à sua reunião com estes. Devido às
nossas limitações não temos condição ainda de fazer “aquela festa” no momento
da partida como fazemos quando nossos entes queridos chegam, ou melhor, renascem
entre nós. Mas se isso ainda não é possível, já conseguimos ficar satisfeitos, felizes
pelo encerramento de mais um ciclo e o recomeço de uma nova etapa na vida daquele
que amamos.
Não
julguemos o próximo afirmando que por crer no Espiritismo ele não pode ou não
deve chorar diante da desencarnação de alguém que ama, pois o choro em si não é
sinônimo de desespero ou descrença na imortalidade da alma. Que possamos consolar
e compartilhar amor nesse momento, como verdadeiros espíritas³. Que o trecho da
letra da música espírita “Se Eu Partir Primeiro” traga conforto nesse momento
de separação temporária:
SE
EU PARTIR PRIMEIRO
(Autores:
Vinícius Oliveira e Gabriela De Carli)
Se eu partir antes de você Peço, me faça um favor, Chore
apenas por saudade E não... não se entristeça! O Sol que se põe no horizonte
nasce agora no lado de lá das montanhas E vai renascer amanhã. E até lá, até
logo.
(...) Lembre que não está só, lembre que nada mudou,
continuamos juntos pelo amor.
Sem
ter medo, siga em frente. Qualquer dia nós iremos nos rever. (...).
Notas:
¹ Emmanuel fala sobre a saudade nesse contexto na resposta à pergunta 329 do livro “O Consolador”, psicografado por Chico Xavier, nos alertando que nos espíritos superiores tal sentimento possui outra conotação, sublime e mais forte, por nascer de uma sensibilidade também superior.
² O tópico 21, intitulado “Perda de Pessoas Amadas”, do Capítulo V do E.S.E., ressalta a importância da prece como fonte de consolo nesse momento: Vós que compreendeis a vida espiritual, escutai as pulsações do vosso coração a chamar esses entes bem-amados e, se pedirdes a Deus que os abençoe, em vós sentireis fortes consolações, dessas que secam as lágrimas; sentireis aspirações grandiosas que vos mostrarão o porvir que o soberano Senhor prometeu. – Sanson, ex-membro da
Sociedade Espírita de Paris. (1863.)
³ Em relação ao pranto diante da desencarnação de uma pessoa amada, Emmanuel traz lição preciosa na mensagem cujo título é “Mortos Amados”, do livro “Na Era do Espírito”, psicografia de Chico Xavier, Editora GEEM: (...) Chora, quando não possas evitar o pranto que se te derrama da alma; no entanto, converte quanto possível as próprias lágrimas em bênçãos
de trabalho e preces de esperança, porquanto eles todos te ouvem o coração na Vida Superior, sequiosos de se reunirem contigo para o reencontro no trabalho do próprio aperfeiçoamento, à procura do amor sem adeus.
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Revista
Joseph Gleber - Ano 1 - Edição 5 - Maio 2017